Tambuladeira
Tembladeira
Prata Portuguesa
Marca de ensaiador de Lisboa (séc. XVII/1720)
Marca de ourives Eugénio da Costa - “ENDC”
Lisboa, séc. XVII (segunda metade)
Dim.: 15 x 27 x 20,5 cm
Peso: 415 g
Drinking cup (tembladeira)
Portuguese silver
Lisbon’s assayer mark (17th century/1720)
Silversmith’s mark, Eugénio da Costa – “ENDC”
17th century (2nd half)
15 x 27 x 20.5 cm
Weight: 415 g
Certificate of Authenticity S. Ruival and H. Braga
As is true for other types of Portuguese domestic silver from the early modern period, little attention has been paid to the so-called "tembladeiras" or "tambuladeiras" (wine vessels), as well as to their origin (and that of the term used), and to their function, although the term has conquered in the last decades the milieu of both antique dealers and collectors.
According to the contemporary meaning of the word, "tambuladeira" or "tembladeira" is a silver disc with raised edges and a central boss not unlike the bottom of a wine bottle, used to assess the density of the wine, to appreciate its smell and colour. It is, therefore, a small silver vessel (with or without a side handle) to taste wine, a type of vessel of which several seven and eighteenth century examples survive, namely of French manufacture, such as one (4.5 x 11.6 x 8.5 cm) in the Victoria and Albert Museum, London, inv. M.14-1948.
However, sixteenth and seventeenth-century Portuguese dictionaries, such as the Vocabulario portuguez e latino by Raphael Bluteau (1638-1734), do not record the word "tembladeira", which undoubtedly comes from the Spanish word "tembladera" or "Vaso ancho de plata, oro, ù vidrio, de figura redonda, con dos assas à los lados, y un pequeño assiento. Las hai de muchos tamaños, por hacerse regularmente de una hoja mui delgada, que parece que tiembla, por lo que se le dió este nombre” (or "A wide vessel made from silver, gold or glass, round with side handles and small flat underside. They come in many sizes and are made of a very thin sheet which seems to tremble, thus explaining their name"), as the Diccionario de Autoridades (1739) informs us. The word is thus explained, deriving from the little thickness of the hand forged sheet silver with which such vessels are made.
Vessels of this type, with two side handles, are depicted in seventeenth-century Portuguese painting, such as a still life - which has previously been attributed to Josefa d’Ayala, or of Óbidos (1630-1684) and dated to ca. 16601670 -, attributed to Baltazar Gomes Figueira (1604-1674) on account of the serene and sober composition, from ca. 1645-1647 and now at the Museu Nacional de Arte Antiga, Lisbon (inv. no. 1718 Pint), given that the centre is occupied by a silver flat circular dish raised on a foot, upon which rests a glass drinking cup with handles.
While the cup is known in Portuguese as “barnegal” (probably from the Spanish word “bernegal”, a wide, shallow vessel used for drinking water or wine), the footed dish, with a upturned rim, is recorded as “pratel” (literally “small dish”).
This type of footed dish was used for making the ceremonial tasting of wine for poisons or “fazer a salva”. It is to this shape - and not to the drinking bowls (“taças para salva”) which evolved from the medieval hanap - that the words of Bluteau apply when he explains the word “salva”: “A peça de ouro, prata, ou outra materia, sobre que se serve ao senhor o vaso, em que ha de beber” or “the objects, made from gold, silver or other material, onto which rests the cup given to one’s master to drink from”.
This footed dish (also used to serve sweetmeats and other delicacies, known in French as soucoupe, literally “under the cup”) in its plain, undecorated and highly polished surface, certainly made with a lathe, stands as testimony to the prevalent taste for “estilo chão” in seventeenth-century Portuguese silver, where the purity of form dominates over any need for superfluous decoration.
It becomes clear now that in the early modern period in Portugal the wine tasting took place on the “pratel” or small dish were the drinking vessel rests (used not for tasting but for drinking), a function which today belongs to the “tembladeira”, a miniature wine taster with a single handle.
A rare and important large drinking cup or tembladeira produced more for display than for actual use, fully Baroque in style. With a nearly cylindrical body and a large flat base, it features a heavy gadrooned, embossed rim, with eight large almost hemispheric wedges, while the lower section is decorated with a sinuous geometric mesh, resulting in highly embossed reserves decorated with quatrefoils. The side handles - probably made by sand casting, are "S"-shaped, with its outer side worked with files - rising well above the rim of the bowl. One of the most curious aspects of the present tembladeira is the decorative sophistication of the underside, which is heavily worked in low-relief repoussé and finely chased with a large stylized flower, using different tools for distinct effects, not unlike the decoration of some “salvers” or display dishes with similar floral decoration. It features a European coat of arms of in the rocaille decorative style, therefore a later addition made some decades after its manufacture, with the motto: "POST-MORTEM-VIRTUS-VIRESCIT". In addition to the Lisbon’s assayer mark dated to the final decades of the seventeenth century and early decades of the following, at a time when the marking of silver received a new legal frame after a long period where such marks rarely appear, the present tembladeira features a goldsmith's mark, who has been identified with Eugénio da Costa, a prolific silversmith from whom some gadrooned "salvers" and similar drinking cups are known.
Hugo Miguel Crespo
Bibliography:
Hugo Miguel Crespo (ed.), À Mesa do Príncipe. Jantar e Cear na Corte de Lisboa (1500-1700). At the Prince's Table. Dining at the Lisbon Court (1500-1700), Lisboa, AR-PAB, 2018.
Vítor Serrão, M. Nicolas Sainte Fare Garnot (eds.), Rouge et Or. Trésors du Portugal Baroque (cat.), Lisboa, Gabinete das Relações Internacionais, 2001.
À semelhança do que sucede com outras tipologias de prataria civil portuguesa dos inícios da Época Moderna, pouca atenção têm merecido as ditas “tembladeiras” ou “tambuladeiras”, quer quanto à sua origem (e à do vocábulo), quer quanto à sua função, embora a designação tenha conquistado nas últimas décadas o meio dos antiquários e o dos coleccionadores.
De acordo com as mais recentes acepções do vocábulo, “tambuladeira” ou “tembladeira” seria um disco de prata com a borda e o centro elevados à maneira de fundo de garrafa, destinado a avaliar a densidade do vinho, apreciar o seu cheiro e cor.
Tratar-se-ia, portanto, de um vaso de prata de pequenas dimensões (com ou sem pega lateral) para provar vinho, tipologia da qual subsistem diversos exemplares seis e setecentistas de fabrico francês, por exemplo, como um (4,5 x 11,6 x 8,5 cm) no Victoria and Albert Museum, Londres, inv. M.14-1948.
No entanto, a lexicografia seis e setecentista portuguesa, como o Vocabulario portuguez e latino de Raphael Bluteau (1638-1734) não regista o termo “tembladeira”, que sem dúvida deve provir do castelhano “tembladera” ou “Vaso ancho de plata, oro, ù vidrio, de figura redonda, con dos assas à los lados, y un pequeño assiento. Las hai de muchos tamaños, por hacerse regularmente de una hoja mui delgada, que parece que tiembla, por lo que se le dió este nombre” (ou “Vaso largo de prata, ouro ou vidro, redondo e com asas laterais e pequeno fundo plano”), como nos diz o Diccionario de Autoridades (1739). Fica assim explicado o termo, derivado da pequena espessura da folha de prata batida com que tais vasos eram produzidos.
Vasos deste tipo, com duas asas, surgem na nossa pintura seiscentista, como numa natureza-morta - antes atribuída a Josefa d’Ayala, ou de Óbidos e datada de ca. 1660-1670 -, atribuída a Baltazar Gomes Figueira (1604-1674) tendo em conta a composição serena e sóbria e agora no Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa (inv. no. 1718 Pint) e onde o centro é ocupado por um prato circular plano elevado num pé circular, sobre o qual pousa uma taça de beber de vidro com asas.
Enquanto a taça se conhece em Portugal neste período como “barnegal” (porventura do castelhano “bernegal”, vaso largo e baixo para beber água ou vinho), o prato com pé, de rebordo revirado, surge documentado como pratel (literalmente “prato pequeno”).
Este tipo de prato com pé era usado para a prova ritual do vinho, contra possíveis venenos ou como salva. É a esta tipologia - e não às taças de beber (taças para salva) que evoluíram do hanap medieval - que se aplicam as palavras de Bluteau, quando explica a palavra salva: “A peça de ouro, prata, ou outra materia, sobre que se serve ao senhor o vaso, em que ha de beber”.
Este prato com pé (usado também para servir doces ou outras iguarias, conhecido em francês como soucoupe, literalmente “por debaixo do taça”) pela sua superfície altamente polida e não decorada, certamente produzido ao torno, serve de testemunho quanto ao gosto prevalecente pelo estilo chão na prataria portuguesa do século XVII, onde a pureza da forma domina sobre qualquer necessidade de decoração supérflua.
Percebe-se, assim que nos inícios da Época Moderna em Portugal a prova do vinho se fazia então no pratel ou pequeno prato onde assentava o vaso de beber (usado não para a prova mas para a toma), função hoje atribuída à “tembladeira”, de forma miniatural e apenas com uma asa.
Rara e importante tembladeira de grandes dimensões, peça produzida mais para exibição do que para uso, de cariz barroco.
De corpo quase cilíndrico e larga base plana, apresenta o remate superior godronado, com oito grandes gomos semi-esféricos muito salientes, e registo inferior decorado por malha geométrica em curva e contra-curva, resultando em reservas elevadas decoradas por quadrifólios.
As asas, provavelmente obtidas por fundição em areia, são em “S” quebrado e de perfil interrompido, recortado à lima, projectando-se bem acima do rebordo do corpo.
Um dos aspectos mais curiosos desta presente tembladeira é o requinte decorativo do fundo, cuja face exterior foi integralmente repuxada e cinzelada com larga flor estilizada, com recurso a cinzéis de diferentes efeitos, afim da decoração de algumas “salvas” ou pratos de aparato com semelhante decoração floral.
Apresenta também um brasão de armas europeu já de estilo rocaille, portanto posterior em algumas décadas à feitura da peça, sobre um listel com o mote: “POST-MORTEM-VIRTUS-VIRESCIT”.
Para além da marca de ensaiador de Lisboa referente à transição entre o século XVII e o seguinte, num momento onde a marcação da prataria recebeu nova imposição legal após um largo período onde é raro surgirem, a presente tembladeira apresenta marca de ourives identificado como Eugénio da Costa, prolixo prateiro de que se conhecem algumas “salvas” de gomos e outras tembladeiras.
Bibliografia
CRESPO, Hugo Miguel (ed.), À Mesa do Príncipe. Jantar e Cear na Corte de Lisboa (1500-1700). At the Prince's Table. Dining at the Lisbon Court (1500-1700), Lisboa, AR-PAB, 2018.
SERRÃO, Vítor, GARNOT, M. Nicolas Sainte Fare (eds.), Rouge et Or. Trésors du Portugal Baroque (cat.), Lisboa, Gabinete das Relações Internacionais, 2001.
- Arte Portuguesa e Europeia
- Pratas