A paixão pela faiança portuguesa do século XVII, embora tardia, chegou com grande intensidade e quase se tornou uma obsessão. A qualidade e a beleza destas obras de arte, assim como, a ingenuidade e criatividade dos oleiros, associadas ao contexto histórico em que se inserem, foram decisivas no despertar deste gosto, onde foi determinante a chamada de atenção do António Afonso Lima. Para ela, têm contribuído alguns amigos — Nuno Silva, Alexandre Pais, Manuel da Bernarda, João Teixeira, José Meco, Teresa Peralta, entre outros — que muito me ensinaram, sempre numa divertida cavaqueira, com troca de opiniões que foram alicerçando o conhecimento. Deslumbrado com esta descoberta — pouco conhecida, quer em terras lusas, quer além-fronteiras — e, irritado por a sua identidade ser constantemente usurpada — ainda hoje é, por muitos, referida como faiança de Hamburgo — propus ao Philippe Mendes uma exposição em Paris, ideia que ele rapidamente abraçou. Efectivamente, a faiança é um marco importante no cruzamento de culturas por, a par da joalharia, constituir uma das primeiras “chinoiserie”, ao introduzir o exotismo dos motivos chineses em peças fabricadas na Europa. Com este sentimento de cruzada, pusemo-nos a caminho desta cidade, o que viria a ser um importante marco na divulgação desta cerâmica, que é tão nossa, que nos é tão querida e que está
tão esquecida. O sucesso foi estrondoso, com inúmeras reportagens na comunicação social parisiense. Com grande orgulho vi o aquamanil da minha colecção ser considerado “L’oeuvre du mois” na Conaissance des Arts n.º 755 de 2017. Seguiu-se o pedido de empréstimo de um núcleo de peças para uma exposição sobre porcelana chinesa do período Ming Wanli no Museu Guimet, em 2019, uma conferência na Bélgica sobre o tema e o interesse crescente de museus europeus, americanos e, até, chineses pelas nossas faianças. Missão cumprida! Tinha-se iniciado uma nova etapa na divulgação da cerâmica portuguesa, que deixou de ser nossa, transformando-se numa Faiança do Mundo. Com orgulho recordo contactos de conservadores de museus de diversos países, em diferentes continentes, que visitaram a exposição e me questionavam se, a origem de peças das suas
colecções, catalogadas como faiança de Hamburgo, não seria na verdade portuguesa. É com muito orgulho que a São Roque se digna dizer: Batalha Vencida.
Todo este sucesso leva-me a partilhar convosco novas peças, neste segundo volume, na esperança que possa vir constituir mais um contributo para a divulgação da faiança portuguesa. Agradeço a todos os que de alguma forma me ajudaram nesta tentativa de colocar a faiança portuguesa no lugar certo.
Mário Roque