Contador Indo-português / An Indo-Portuguese Writing Cabinet, India, Guzarate, finais do séc. XVI / Gujarat end of the 16th c.
sissó, ébano, marfim e cobre dourado / sisso, ebony, ivory and gilt copper
25 x 39,5 x 28,5 cm
F1253
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This rare fall-front writing cabinet, now missing its original lid, was made in Gujarat for the Portuguese market in the second half of the 16th century. Assembled in teak (Tectona grandis), it is lavishly veneered in ebony (Dyospiros ebenum), rather than in the more common East Indian rosewood, inlaid with teak, ivory and green-dyed bone marquetry motifs and ornamented with gilt copper fittings that include side handles and drawer pulls, as well as a central lock-plate shaped as a double-headed eagle or gandabherund – a Hindu mythological bird believed to possess magical strength and the power to ward off evil. Similarly to its contemporary congeners, its shape reflects a European prototype that ranked highly amongst prestigious 16th century pieces of storage furniture.The missing hinged front would open to reveal a writing surface and the multiple drawers for storing writing paraphernalia and all kinds of smaller treasured objects. Such utilitarian objects made in the Orient with exotic raw materials became highly desirable in Europe both due to their decorative appeal and technical sophistication. The production of this type of furniture was based in north-western India, namely in Gujarat. The lateral elevations, as well as the cabinet’s top panel, are characterised by a central composition with floral scrolls of Timurid (Persian) origin, set in double symmetry. These decorative elements, comprising large stylized lotus flowers derived from Chinese ceramics and textile patterns skilfully outlined by fine metallic thread, a detail rare in this production, are closely related to the contemporary Gujarati furniture production with mother-of-pearl inlays on a dark mastic ground. The wide border “S” shaped motifs of zoomorphic terminals, used solely on the cabinet’s top panel, are rare elements in this production that are also present on the altar front, converted into a table top, now at the Victoria and Albert Museum, London (inv. IS.15 -1882). Another object from the same museum (inv. 18-1897) and identical origin, a writing cabinet also missing its fall-front, does feature a border with the same type of “S” shaped motif on the top panel.In clear contrast, the back panel features a central ground with five flowering trees alternating with four vultures pecking their chests, the jatayuh, another apotropaic figure of similar symbolic value to the double-headed eagle or gandabherund.The cabinet is fitted with nine drawers over four tiers with a larger central square drawer. While the decorative motifs on the fronts of the smaller drawers consist of symmetrically arranged flowering plants and birds, including pea hens, the central drawer front features a large flowering tree flanked by a couple in Islamic attire, a detail that reinforces the cabinet’s matrimonial association. On the left hand side the male figure is wearing jama (coat), pay-jama (tight-fitting pants), patka (waist sash) and kulahdar (small turban), and, on the right, the female in ghaghra (long pleated skirt), odhani (long veil) and choli (blouse).
Hugo Miguel Crespo
Centre for History, University of Lisbon
Bibliography:
CRESPO, Hugo Miguel, Choices, Lisboa, AR-PAB, 2016.
CRESPO, Hugo Miguel, India in Portugal. A Time of Artistic Confluence (cat.), Porto, Bluebook, 2021.
JAFFER, Amin, Luxury Goods from India. The Art of the Cabinet-Maker, London, V&A Publications, 2002.
Este raro escritório, sem o tampo de abater que teria na origem, foi produzido no Guzarate para o mercado português na segunda metade do século XVI replicando protótipo europeu. De estrutura em teca (Tectona grandis), é faixeado a ébano (Dyospiros ebenum) e decorado com embutidos de teca, marfim, e osso tingido de verde. As ferragens de cobre dourado incluem duas pesadas gualdras, o espelho da fechadura da gaveta central em forma de águia bicéfala ou gandabherunda - ave mitológica hindu imbuída de força mágica utilizada para afastar o mal e proteger as preciosidades aí contidas - e os puxadores das restantes gavetas. A par dos contadores de mesa e estrado, este escritório copia um protótipo europeu que granjeou lugar de destaque entre as peças mais prestigiadas de mobiliário de conter no século XVI. O tampo de abater formaria uma superfície apropriada à escrita, enquanto as muitas gavetas dão acesso aos objectos preciosos e instrumentos de escrita contidos no interior. Este tipo de mobiliário de luxo foi predominante na decoração de interiores das famílias nobres e patrícias, e peças de mobiliário portáteis como esta tornar-se-iam requisito fundamental para os funcionários europeus, mercadores e comerciantes que viviam e viajavam pela Ásia. Peças deste tipo foram produzidas na Ásia com materiais exóticos e dispendiosos como o precioso ébano, sendo muito admirados e avidamente procurados na Europa, devido não só à sua forma, mas também à sua perfeição técnica e riqueza decorativa. A produção deste tipo de mobiliário centrou-se no noroeste da Índia, nomeadamente no Guzarate. A decoração do topo e ilhargas deste raro escritório, dado ser integralmente faixeado a ébano ao contrário do mais usual sissó, apresenta campo central de enrolamentos vegetalistas de origem timúrida (persa), dispostos em simetria dupla. Esta decoração de grandes flores-de-lótus estilizadas derivadas da arte chinesa (têxteis e cerâmica) aqui enriquecida com a rara utilização de fio metálico, irmana-se na produção também guzarate do mobiliário precioso de embutidos de madrepérola sobre fundo de mástique escuro desta mesma cronologia. Os motivos em “S” com terminais zoomórficos das cercaduras, exclusivamente utilizados no topo do escritório, são raros nesta produção guzarate, que encontramos também no frontal de altar, convertido em mesa, do Victoria and Albert Museum, Londres (inv. IS.15-1882) desta mesma produção. Um outro objecto do mesmo museu (inv. 18-1897) e desta mesma produção, um escritório ao qual lhe falta também o tampo de abater, apresenta igualmente na face do topo uma cercadura com o mesmo tipo de motivo em “S”. Em contraste com o topo e ilhargas, o tardoz do nosso escritório apresenta campo central preenchido por cinco árvores floridas prenhes de folhas flanqueadas por quatro abutres que bicam o peito representando jatayuh, figura apotropaica tal como a águia bicéfala. O escritório apresenta nove gavetas dispostas em quatro fiadas com uma gaveta quadrada ao centro de maiores dimensões. Enquanto a decoração embutida da frente das gavetas mais pequenas consiste em plantas floridas e aves simetricamente dispostas (incluindo pavões fêmea), a frente da gaveta central apresenta uma grande árvore florida flanqueada por um casal trajando à islâmica, reforçando a natureza nupcial do presente escritório. À esquerda, ele veste jama (casaco), pay-jama (calças ajustadas), patka (faixa de cintura) e kulahdar (pequeno turbante), e ela, à direita, veste ghaghra (saia longa pregueada), odhani (véu longo) e choli (blusa).
Hugo Miguel CrespoCentro de História, Universidade de Lisboa
Bibliografia:
CRESPO, Hugo Miguel, Choices, Lisboa, AR-PAB, 2016.
CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal. Um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Bluebook, 2021.
JAFFER, Amin, Luxury Goods from India. The Art of the Cabinet-Maker, London, V&A Publications, 2002.
Hugo Miguel Crespo
Centre for History, University of Lisbon
Bibliography:
CRESPO, Hugo Miguel, Choices, Lisboa, AR-PAB, 2016.
CRESPO, Hugo Miguel, India in Portugal. A Time of Artistic Confluence (cat.), Porto, Bluebook, 2021.
JAFFER, Amin, Luxury Goods from India. The Art of the Cabinet-Maker, London, V&A Publications, 2002.
Este raro escritório, sem o tampo de abater que teria na origem, foi produzido no Guzarate para o mercado português na segunda metade do século XVI replicando protótipo europeu. De estrutura em teca (Tectona grandis), é faixeado a ébano (Dyospiros ebenum) e decorado com embutidos de teca, marfim, e osso tingido de verde. As ferragens de cobre dourado incluem duas pesadas gualdras, o espelho da fechadura da gaveta central em forma de águia bicéfala ou gandabherunda - ave mitológica hindu imbuída de força mágica utilizada para afastar o mal e proteger as preciosidades aí contidas - e os puxadores das restantes gavetas. A par dos contadores de mesa e estrado, este escritório copia um protótipo europeu que granjeou lugar de destaque entre as peças mais prestigiadas de mobiliário de conter no século XVI. O tampo de abater formaria uma superfície apropriada à escrita, enquanto as muitas gavetas dão acesso aos objectos preciosos e instrumentos de escrita contidos no interior. Este tipo de mobiliário de luxo foi predominante na decoração de interiores das famílias nobres e patrícias, e peças de mobiliário portáteis como esta tornar-se-iam requisito fundamental para os funcionários europeus, mercadores e comerciantes que viviam e viajavam pela Ásia. Peças deste tipo foram produzidas na Ásia com materiais exóticos e dispendiosos como o precioso ébano, sendo muito admirados e avidamente procurados na Europa, devido não só à sua forma, mas também à sua perfeição técnica e riqueza decorativa. A produção deste tipo de mobiliário centrou-se no noroeste da Índia, nomeadamente no Guzarate. A decoração do topo e ilhargas deste raro escritório, dado ser integralmente faixeado a ébano ao contrário do mais usual sissó, apresenta campo central de enrolamentos vegetalistas de origem timúrida (persa), dispostos em simetria dupla. Esta decoração de grandes flores-de-lótus estilizadas derivadas da arte chinesa (têxteis e cerâmica) aqui enriquecida com a rara utilização de fio metálico, irmana-se na produção também guzarate do mobiliário precioso de embutidos de madrepérola sobre fundo de mástique escuro desta mesma cronologia. Os motivos em “S” com terminais zoomórficos das cercaduras, exclusivamente utilizados no topo do escritório, são raros nesta produção guzarate, que encontramos também no frontal de altar, convertido em mesa, do Victoria and Albert Museum, Londres (inv. IS.15-1882) desta mesma produção. Um outro objecto do mesmo museu (inv. 18-1897) e desta mesma produção, um escritório ao qual lhe falta também o tampo de abater, apresenta igualmente na face do topo uma cercadura com o mesmo tipo de motivo em “S”. Em contraste com o topo e ilhargas, o tardoz do nosso escritório apresenta campo central preenchido por cinco árvores floridas prenhes de folhas flanqueadas por quatro abutres que bicam o peito representando jatayuh, figura apotropaica tal como a águia bicéfala. O escritório apresenta nove gavetas dispostas em quatro fiadas com uma gaveta quadrada ao centro de maiores dimensões. Enquanto a decoração embutida da frente das gavetas mais pequenas consiste em plantas floridas e aves simetricamente dispostas (incluindo pavões fêmea), a frente da gaveta central apresenta uma grande árvore florida flanqueada por um casal trajando à islâmica, reforçando a natureza nupcial do presente escritório. À esquerda, ele veste jama (casaco), pay-jama (calças ajustadas), patka (faixa de cintura) e kulahdar (pequeno turbante), e ela, à direita, veste ghaghra (saia longa pregueada), odhani (véu longo) e choli (blusa).
Hugo Miguel CrespoCentro de História, Universidade de Lisboa
Bibliografia:
CRESPO, Hugo Miguel, Choices, Lisboa, AR-PAB, 2016.
CRESPO, Hugo Miguel, A Índia em Portugal. Um Tempo de Confluências Artísticas (cat.), Porto, Bluebook, 2021.
JAFFER, Amin, Luxury Goods from India. The Art of the Cabinet-Maker, London, V&A Publications, 2002.
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