Placa-Oratório Representando a Circuncisão / An Altar Plaque with the "Circuncision", Sul da China ou Filipinas / South China or The Philipines, c. 1600
Marfim / Ivory
14,5 x 10, 5 cm
F1439
This fine ivory plaque, carved in the Philippines (Manila) by Chinese craftsmen, was intended for private devotional practice and depicts the New Testament episode of The Circumcision (Luke 2:21). Carved from a single transversely cut section of elephant ivory, it is remarkable for its carving quality, modelling, and exceptional final polish. The carver’s Chinese origin is evident from the characteristic treatment of clouds, almond-shaped eyes of distinctive eyelids, and geometric schematism of drapery folds. Unlike other similar ivory plaques carved in the Philippines, the one herein described does not strictly follow a specific printed source, its composition, which may be considered original, seemingly drawing from two engravings by Heinrich Ulrich the Elder (1567-after 1621). These, belonging to a series of thirty-two small prints (approx. 8 x 7 cm) dating from between 1590 and 1621 and depicting Scenes from the Life Christ, were published under the title Vita, passio et resurrectio Jesu Christi. Heinrich Ulrich the Elder, was born in Nuremberg, where he worked from 1595, later moving to Wolfenbüttel (1600-1602) and Vienna (1613-1619). Some of his numerous published printed works were based on compositions by Netherlandish artists such as Maerten de Vos (1532-1603) and Hendrick Goltzius (1558-1617). From Ulrich’s Circumcision print (no.5), the carver borrowed the figure of The Child Christ, although inverting His legs position as well as the holding priest’s figure. The vertical arrangement of two male characters carrying torches and the general form of the curtain to the right, do also reflect this engraving. From the Presentation in the Temple (no.7) the carver adapted the kneeling Virgin, now empty handed, Saint Joseph behind Her and the standing high priest. This latter print has also provided much of the architectural setting, although the arches in the background were somewhat misunderstood by the master carver. In accordance with Jewish law and as a testimony to his obedience to Biblical law, Jesus was circumcised eight days after his birth, during the Brit milah ceremony in which he was named. This event has traditionally been regarded as the first shedding of Christ’s blood, thus marking the beginning of humanity’s redemption and proof of Christ’s full humanity. During the sixteenth and seventeenth centuries, the Circumcision held particular significance in missionary activity in Asia, in its alignment with Counter-Reformation principles. As Christ’s first act of obedience to divine law, the episode symbolised humility and submission, thus providing a model for the newly converted to embrace Church authority and submit to its teachings. In the Counter-Reformation context, this concept reinforced loyalty to the Catholic Church amid the growing Protestant challenges.The event, prefiguring the Passion and the establishment of a universal covenant, underscored the importance of sacramental participation. Missionaries paralleled this with baptism, as the rite of initiation into the new covenant, and ultimately as essential for salvation.Devotional plaques of complex religious imagery were not simply intended as visual aids for the evangelical teaching practices promoted in Asia by the Jesuits, but also as export items, particularly to Central and South America and the Iberian Peninsula. Recent archaeological finds, notably from the Manila galleon Santa Margarita (1601), shipwrecked off the Mariana islands (Ladrones), have yielded valuable information on the chronology and making of devotional ivories by Chinese and Filipino master carvers in early seventeenth-century Philippines, a production that predated by several decades the Goan ivory carving industry.
Hugo Miguel Crespo
Esta placa religiosa para devoção privada representando o episódio neotestamentário da Circuncisão (Lucas 2: 21) foi finamente entalhada em marfim por artífices chineses nas Filipinas (Manila).
Entalhada de uma única secção transversal de marfim de elefante, é extraordinária pela qualidade do entalhe, modelado e fino polimento final. A origem chinesa do entalhador é visível no tratamento típico das nuvens, no rasgamento dos olhos amendoados e na esquematização geométrica dos panejamentos.
Ao contrário de muitas outras placas semelhantes de marfim entalhado produzidas nas Filipinas, esta não segue cegamente uma composição gravada específica. A sua composição, que pode assim ser considerada original, parece inspirar-se em duas gravuras de Heinrich Ulrich, o Velho, produzidas entre 1590 e 1621. Abertas a buril, ambas fazem parte de uma série de trinta e duas pequenas gravuras (aproximadamente 8,0 x 7,0 cm) intitulada Vita, passio et resurrectio Jesu Christi, representando Cenas da vida de Cristo. Heinrich Ulrich, o Velho (1567-depois de 1621), nasceu em Nuremberga, onde trabalhou desde 1595, mudando-se depois para Wolfenbüttel (1600–1602) e Viena (1613-1619), publicando numerosas gravuras. Algumas destas basearam-se em composições de artistas neerlandeses como Maerten de Vos (1532–1603) e Hendrick Goltzius (1558–1617).
Da gravura de Ulrich representando a Circuncisão (n.º 5), o mestre entalhador tomou a figura do Menino Jesus, embora tenha invertido a posição das pernas, bem como a figura do sacerdote que segura a criança. A disposição vertical das duas figuras masculinas, que seguram longas velas e a forma da cortina à direita são também tomadas desta gravura. Da Apresentação no Templo (n.º 7), o entalhador tomou a figura ajoelhada da Virgem, agora sem qualquer objecto nas mãos, e de S. José, de pé atrás de Nossa Senhora, assim como a figura do sumo sacerdote. Esta gravura forneceu também grande parte do cenário arquitectónico, embora os arcos da cena interior tenham sido algo mal interpretados pelo entalhador local.
Em conformidade com a lei judaica e como testemunho da sua obediência à lei bíblica, Jesus foi circuncidado oito dias após o seu nascimento durante a cerimónia Brit milah na qual recebeu o nome. Segundo a tradição, este episódio é considerado como a primeira vez que o sangue de Cristo foi derramado, marcando o início da redenção da humanidade e prova de que Cristo era plenamente humano.
Nos séculos XVI e XVII, a Circuncisão de Cristo assumiu particular importância no contexto das missões na Ásia, em consonância com o pensamento da Contra-Reforma. Enquanto primeiro acto de obediência de Cristo à lei divina, simbolizava humildade e submissão, oferecendo modelo para os recém-convertidos abraçarem a autoridade da Igreja e submeterem-se aos seus ensinamentos, no contexto da Contra-Reforma, reforçava a lealdade à Igreja Católica face aos desafios protestantes. O evento, interpretado como a primeira efusão do sangue de Cristo, como prefiguração da Paixão e estabelecimento de uma aliança universal, sublinhava a importância da participação sacramental. Os missionários traçavam assim paralelos entre este acto e o baptismo, visto como o rito de iniciação na nova aliança e, em última análise, como essencial para a salvação.
Esta e outras placas semelhantes, de complexa iconografia religiosa, foram não apenas concebidas enquanto suporte visual para práticas devocionais, incentivadas pelos jesuítas na Ásia no seu esforço missionário, mas também como objecto para exportação, em particular para a América Central e do Sul e para a Península Ibérica.
Escavações arqueológicas recentes, caso do naufrágio do galeão de Manila, Santa Margarita (1601), que naufragou junto às Ilhas Marianas (Ladrones), oferecem uma riqueza de informações sobre a cronologia e produção de esculturas devocionais de marfim feitas por mestres entalhadores chineses e filipinos nas Filipinas nos inícios do século XVII; uma produção que antecede em várias décadas a produção de escultura ebúrnea em Goa.
Hugo Miguel Crespo
Hugo Miguel Crespo
Esta placa religiosa para devoção privada representando o episódio neotestamentário da Circuncisão (Lucas 2: 21) foi finamente entalhada em marfim por artífices chineses nas Filipinas (Manila).
Entalhada de uma única secção transversal de marfim de elefante, é extraordinária pela qualidade do entalhe, modelado e fino polimento final. A origem chinesa do entalhador é visível no tratamento típico das nuvens, no rasgamento dos olhos amendoados e na esquematização geométrica dos panejamentos.
Ao contrário de muitas outras placas semelhantes de marfim entalhado produzidas nas Filipinas, esta não segue cegamente uma composição gravada específica. A sua composição, que pode assim ser considerada original, parece inspirar-se em duas gravuras de Heinrich Ulrich, o Velho, produzidas entre 1590 e 1621. Abertas a buril, ambas fazem parte de uma série de trinta e duas pequenas gravuras (aproximadamente 8,0 x 7,0 cm) intitulada Vita, passio et resurrectio Jesu Christi, representando Cenas da vida de Cristo. Heinrich Ulrich, o Velho (1567-depois de 1621), nasceu em Nuremberga, onde trabalhou desde 1595, mudando-se depois para Wolfenbüttel (1600–1602) e Viena (1613-1619), publicando numerosas gravuras. Algumas destas basearam-se em composições de artistas neerlandeses como Maerten de Vos (1532–1603) e Hendrick Goltzius (1558–1617).
Da gravura de Ulrich representando a Circuncisão (n.º 5), o mestre entalhador tomou a figura do Menino Jesus, embora tenha invertido a posição das pernas, bem como a figura do sacerdote que segura a criança. A disposição vertical das duas figuras masculinas, que seguram longas velas e a forma da cortina à direita são também tomadas desta gravura. Da Apresentação no Templo (n.º 7), o entalhador tomou a figura ajoelhada da Virgem, agora sem qualquer objecto nas mãos, e de S. José, de pé atrás de Nossa Senhora, assim como a figura do sumo sacerdote. Esta gravura forneceu também grande parte do cenário arquitectónico, embora os arcos da cena interior tenham sido algo mal interpretados pelo entalhador local.
Em conformidade com a lei judaica e como testemunho da sua obediência à lei bíblica, Jesus foi circuncidado oito dias após o seu nascimento durante a cerimónia Brit milah na qual recebeu o nome. Segundo a tradição, este episódio é considerado como a primeira vez que o sangue de Cristo foi derramado, marcando o início da redenção da humanidade e prova de que Cristo era plenamente humano.
Nos séculos XVI e XVII, a Circuncisão de Cristo assumiu particular importância no contexto das missões na Ásia, em consonância com o pensamento da Contra-Reforma. Enquanto primeiro acto de obediência de Cristo à lei divina, simbolizava humildade e submissão, oferecendo modelo para os recém-convertidos abraçarem a autoridade da Igreja e submeterem-se aos seus ensinamentos, no contexto da Contra-Reforma, reforçava a lealdade à Igreja Católica face aos desafios protestantes. O evento, interpretado como a primeira efusão do sangue de Cristo, como prefiguração da Paixão e estabelecimento de uma aliança universal, sublinhava a importância da participação sacramental. Os missionários traçavam assim paralelos entre este acto e o baptismo, visto como o rito de iniciação na nova aliança e, em última análise, como essencial para a salvação.
Esta e outras placas semelhantes, de complexa iconografia religiosa, foram não apenas concebidas enquanto suporte visual para práticas devocionais, incentivadas pelos jesuítas na Ásia no seu esforço missionário, mas também como objecto para exportação, em particular para a América Central e do Sul e para a Península Ibérica.
Escavações arqueológicas recentes, caso do naufrágio do galeão de Manila, Santa Margarita (1601), que naufragou junto às Ilhas Marianas (Ladrones), oferecem uma riqueza de informações sobre a cronologia e produção de esculturas devocionais de marfim feitas por mestres entalhadores chineses e filipinos nas Filipinas nos inícios do século XVII; uma produção que antecede em várias décadas a produção de escultura ebúrnea em Goa.
Hugo Miguel Crespo
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