Perfurmador, 1660-1680
faiança portuguesa / portuguese faience
Alt. / H.: 37,5 cm
C657
Rare 17th century Portuguese faience potpourri vase of pierced and
cut lid, sitting on a ringed, truncated cone foot.
Wheel-thrown and moulded, the outer surfaces are wholly
decorated in cobalt-blue and manganese-purple pigments on a
tin-white enamelled ground.
The semi-spherical bowl decorative composition is defined
by segmented horizontal bands, centred by a broad strip of four
large and equidistant cartouches.
In each cartouche a Chinese figure, either resting or meditating, crossing a bridge or eventually on a balcony or terrace.
Two of the figures are bald and placed diametrically opposed and
alternate with two others wearing turbans. They are surrounded by
delicately painted exotic ‘desenho miúdo’ landscapes with buildings
and vegetation, detailed in a denser cobalt-blue tone. Alternating
with and framing these cartouches a geometric netting pattern in
two different sized patterns. This broad decorative strip is encased
on the top by a double frieze, and supported on the base by two
continuous bands, one wider of juxtaposed ruyi sceptre heads, and
another and of radiating petal like patterns—a degeneration of
Chinese ornamental banana leaves—separated by plain filleting.
The same, albeit mirrored motifs will be repeated on the large convex
ring uniting the bowl to the low, wide and prominent foot ringed
by plain filleting. The flaring rim outer lip surface is encircled by a
frieze of triple bead groups.
The large domed lid is sectioned in various concentric rings.
The two wider ones, isolated by a narrow band of alternating three
bead groups, are composed of zigzagging and triangular stems, filled
by manganese spirals on a bluish ground, forming an interesting cut-out pattern of arrows and triangles. A strip of radiating petals
connects to the tightly strangulated neck from which emerges the
large, rounded knob shaped pierced handle, decorated in manganese spirals, in a similar pattern to the bowl.
The only known example in such typology, this magnificent
potpourri vase stands out for its original mixing of various decorative motifs that fill the whole surface in a characteristic, almost
obsessive, horror vacui.
Of well-known European design, the typology alludes to
China, where potpourri vases were used to fragrance the environments as early as the Xia, Shang and Zhou dynasties (21st to 12th
centuries B.C.), and later adapted by Buddhist purification rituals.
The oriental influence, however, is not restricted to the
function. The decorative grammar is charged with Chinese decorative motifs—miniature like and graphically related to ‘desenho
miúdo’ (cf.: Intro. Ch. IV) at this stage of Portuguese faience production—which frequently appear in association to other innovative
objects and extravagant shapes unseen in earlier periods.
The cartouche decoration of Buddhist monks could, in its
original prototype, represent the history of Xuanzang, as narrated in the ‘Records of The Western Regions’, albeit in this instance
replicated naively by the potter artist who, unaware of its symbolic
meaning, reinterprets it in under his own creative perception.
Xuanzang was a Buddhist monk that went in pilgrimage
to India in order to recover the Buddhist sutra (texts) that would
protect the emperor against the malignant spirits haunting him.
On crossing a bridge, freeing himself from his own body he reached
immortality.
In the Museu Nacional de Arte Antiga, there is a tureen of
similarly shaped lid, albeit smaller (Inv. 2415–CER), that was acquired at the sale of the Count of Ameal collection.
Raro e invulgar perfumador esferóide, rodado e modelado, de tampa vazada e taça assente em anel saliente sobre base tronco-cónica larga, em faiança portuguesa da segunda metade do século XVII, inteiramente decorado a azul-cobalto e roxo de manganês sobre esmalte estanífero branco. Interior desadornado. A taça, em forma semiesférica e com bordo revirado, apresenta decoração segmentada em faixas horizontais, centrada em banda larga no bojo, com quatro reservas ovaladas semelhantes e equidistantes. Estes quadros retratam figuras chinesas, sentadas a repousar ou em meditação, a atravessar uma ponte ou eventualmente cercadas por um varandim. Duas das figuras são calvas, diametralmente opostas e alternam com outras de turbante. Estão envolvidas por paisagem em planos diversos, com edifícios e plantas exóticas de “desenho miúdo”, graciosamente pintados e com expressivos apontamentos de azuis mais densos. Separam as reservas uma malha de reticulados geométricos, de dois modelos alternados, simulando grelhas perspectivadas, que preenchem os espaços intermédios. A banda ornamental do bojo está limitada por duplo friso e termina em duas faixas contiguas, a mais larga com cabeças de ceptros de ruyi justapostas, e a outra, com pétalas radiais—uma degenerescência das folhas de bananeira da gramática ornamental chinesa—separadas por filetes desadornados. Os mesmos motivos, em espelho, vão constituir a decoração do anel convexo, que une a taça à sua base - larga, baixa e proeminente—rematada por filetes lisos. O bordo, revirado, está percorrido por um friso de grupos de três contas, na face inferior.
A tampa, de aba revirada, está dividida em vários anéis concêntricos e diferenciados. Os dois mais largos são constituídos por hastes em zig-zag e triangulares, preenchidas com espirais pintadas a manganês sobre fundo azulado, num curioso padrão vazado de setas e triângulos. A separá-los, anel decorado por grupos de três contas dispostos alternadamente, limitado por duplo filete. Um anel de pétalas radiais serve de ligação ao colo, estrangulado, que une a tampa à pega, em forma de pomo. Está envolvida por filetes lisos e é vazada, decorada com espirais a manganês, seguindo o mesmo padrão da taça. A aba diferencia-se através de um friso preenchido por grupos contínuos de três contas. Único exemplar conhecido com esta tipologia, este magnífico e aparatoso perfumador, destaca-se pela original combinação de diversas decorações usadas na faiança portuguesa da época, ocupando, de forma quase obsessiva, as superfícies disponíveis, num característico horror vacui. Embora a forma seja ocidental, a tipologia do objecto remete para a China, onde os perfumadores eram usados para fins aromáticos desde as dinastias Xia, Shang e Zhou, (XXI a XII a.C.) e, posteriormente adaptados aos rituais budistas e de purificação. A influência oriental não se limita à função. A decoração está carregada de motivos da gramática ornamental chinesa—miniaturais e com a expressão gráfica habitual do “desenho miúdo” (cf.: Intro. Cap. IV) nesta fase avançada da faiança portuguesa seiscentista—e que, com frequência, aparecem associados a objectos de formas inovadoras e aparatosas, inéditas em relação aos períodos anteriores. A decoração das reservas, com figuras de monges budistas poderia, na origem, representar a história de Xuanzang (602–644) narrada no “Registo das Regiões Ocidentais” e reproduzida de forma ingénua pelo artista que, desconhecendo a carga simbólica que transportava, a representa com a sua criatividade decorativa. Xuanzang era um monge budista que partiu para a Índia em peregrinação, para recuperar os escritos (sutras) budistas, com o intuito de proteger o Imperador contra os espíritos malignos que o assombravam. Ao atravessar uma ponte, libertando-se do seu corpo, atingiu a imortalidade. Existe uma terrina com tampa de formato idêntico, embora de menor altura, no acervo do Museu Nacional de Arte Antiga (Inv. n.º 2415–Cer), adquirida no leilão da colecção do Conde de Ameal.
Raro e invulgar perfumador esferóide, rodado e modelado, de tampa vazada e taça assente em anel saliente sobre base tronco-cónica larga, em faiança portuguesa da segunda metade do século XVII, inteiramente decorado a azul-cobalto e roxo de manganês sobre esmalte estanífero branco. Interior desadornado. A taça, em forma semiesférica e com bordo revirado, apresenta decoração segmentada em faixas horizontais, centrada em banda larga no bojo, com quatro reservas ovaladas semelhantes e equidistantes. Estes quadros retratam figuras chinesas, sentadas a repousar ou em meditação, a atravessar uma ponte ou eventualmente cercadas por um varandim. Duas das figuras são calvas, diametralmente opostas e alternam com outras de turbante. Estão envolvidas por paisagem em planos diversos, com edifícios e plantas exóticas de “desenho miúdo”, graciosamente pintados e com expressivos apontamentos de azuis mais densos. Separam as reservas uma malha de reticulados geométricos, de dois modelos alternados, simulando grelhas perspectivadas, que preenchem os espaços intermédios. A banda ornamental do bojo está limitada por duplo friso e termina em duas faixas contiguas, a mais larga com cabeças de ceptros de ruyi justapostas, e a outra, com pétalas radiais—uma degenerescência das folhas de bananeira da gramática ornamental chinesa—separadas por filetes desadornados. Os mesmos motivos, em espelho, vão constituir a decoração do anel convexo, que une a taça à sua base - larga, baixa e proeminente—rematada por filetes lisos. O bordo, revirado, está percorrido por um friso de grupos de três contas, na face inferior.
A tampa, de aba revirada, está dividida em vários anéis concêntricos e diferenciados. Os dois mais largos são constituídos por hastes em zig-zag e triangulares, preenchidas com espirais pintadas a manganês sobre fundo azulado, num curioso padrão vazado de setas e triângulos. A separá-los, anel decorado por grupos de três contas dispostos alternadamente, limitado por duplo filete. Um anel de pétalas radiais serve de ligação ao colo, estrangulado, que une a tampa à pega, em forma de pomo. Está envolvida por filetes lisos e é vazada, decorada com espirais a manganês, seguindo o mesmo padrão da taça. A aba diferencia-se através de um friso preenchido por grupos contínuos de três contas. Único exemplar conhecido com esta tipologia, este magnífico e aparatoso perfumador, destaca-se pela original combinação de diversas decorações usadas na faiança portuguesa da época, ocupando, de forma quase obsessiva, as superfícies disponíveis, num característico horror vacui. Embora a forma seja ocidental, a tipologia do objecto remete para a China, onde os perfumadores eram usados para fins aromáticos desde as dinastias Xia, Shang e Zhou, (XXI a XII a.C.) e, posteriormente adaptados aos rituais budistas e de purificação. A influência oriental não se limita à função. A decoração está carregada de motivos da gramática ornamental chinesa—miniaturais e com a expressão gráfica habitual do “desenho miúdo” (cf.: Intro. Cap. IV) nesta fase avançada da faiança portuguesa seiscentista—e que, com frequência, aparecem associados a objectos de formas inovadoras e aparatosas, inéditas em relação aos períodos anteriores. A decoração das reservas, com figuras de monges budistas poderia, na origem, representar a história de Xuanzang (602–644) narrada no “Registo das Regiões Ocidentais” e reproduzida de forma ingénua pelo artista que, desconhecendo a carga simbólica que transportava, a representa com a sua criatividade decorativa. Xuanzang era um monge budista que partiu para a Índia em peregrinação, para recuperar os escritos (sutras) budistas, com o intuito de proteger o Imperador contra os espíritos malignos que o assombravam. Ao atravessar uma ponte, libertando-se do seu corpo, atingiu a imortalidade. Existe uma terrina com tampa de formato idêntico, embora de menor altura, no acervo do Museu Nacional de Arte Antiga (Inv. n.º 2415–Cer), adquirida no leilão da colecção do Conde de Ameal.
Provenance
Col. M.B., AlcobaçaReproduzido em:Literature
ROQUE, Mário, Lisboa na Origem da Chinoiserie, Lisboa: São Roque, 2018 (pp. 176-179)Join our mailing list
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